Era só questão de tempo até eu mencionar o Stray Kids aqui novamente, e sinceramente? Estou até surpresa que eu tenha esperado dois dias inteiros.
Hoje, quero falar sobre uma das músicas mais caóticas, instigantes e esteticamente marcantes do grupo: S-Class (em coreano, 특 – teuk, que significa “especial”), faixa-título do terceiro álbum de estúdio, ★★★★★ (5-STAR).
Mais do que uma simples música de comeback, S-Class é quase uma declaração de existência, um lembrete de que o Stray Kids não veio para se encaixar, mas para redefinir o nosso gosto musical.
O clipe começa de forma quase cinematográfica: helicópteros cercam o grupo em um espaço amplo que lembra um heliponto — a tensão está no ar antes mesmo da batida começar. A câmera mergulha, e é Felix quem primeiro encara o espectador. Logo depois, é Changbin quem solta os primeiros versos:
“Aqui é Seul, cidade especial
Onde muitos milagres aconteceram
Uma estrela especial surgindo entre as estrelas escondidas”
É impossível não sentir o peso simbólico dessa abertura. Eles estão falando de Seoul, berço da indústria do K-pop, o lugar onde milagres acontecem — mas também onde tantos sonhos são esquecidos. Nesse mar de estrelas escondidas, há uma que se destaca. A mensagem é clara: dentro de um sistema que fabrica ídolos em série, o Stray Kids se coloca como algo raro, talvez até anômalo.
Logo depois, Hyunjin entra com uma transição.
“Cheia de coisas estranhas que não mudam
Ruas movimentadas”
Enquanto Hyunjin encerra seu verso, um espelho se quebra — e esse momento é essencial. O espelho quebrado não é só um efeito estiloso; ele representa o rompimento com o real, a entrada definitiva no estranho, no especial.
Sendo bem sincera, não faço IDEIA do que essas figuras representam, porém posso fazer uma suposição. Os fogos azuis lembram bastante os que flutuam entre eles durante a performance de Thunderous, de 2021. Ali, eles pareciam acompanhar os membros como manifestações visuais de poder ou energia, então talvez aqui cumpram um papel semelhante — um elemento místico que liga esse universo caótico com o universo interior dos próprios integrantes.
O chefe segurando um bolo me fez pensar imediatamente nos chefs de God’s Menu. Pode ser só uma referência visual, mas também pode simbolizar a continuidade do "menu especial" do Stray Kids — como se eles ainda estivessem “cozinhando” coisas únicas, fora do padrão. O bolo, como símbolo de celebração e artificialidade, talvez mostre o quanto tudo à volta deles é cenográfico, excêntrico, mas eles continuam sendo o ingrediente principal. (Stray Kids everywhere all around the world, lembra?)
Em God’s Menu, somos apresentados àqueles homens vestidos de branco que também estão em S-class, com aparência de cientistas ou técnicos de laboratório, mexendo em líquidos coloridos como se estivessem em busca de uma fórmula perfeita — talvez uma metáfora para a criação artística do Stray Kids, que mistura sons, gêneros e conceitos de forma quase alquímica, sempre na tentativa de produzir algo verdadeiramente único.Em God's Menu, também, temos músicos da banda marcial, que trazem uma sensação de ordem e espetáculo. Eles representam o ritmo, o pulso que dá unidade ao caos, como se a música fosse uma força organizadora no meio do colapso visual.
Todos esses elementos, de alguma forma, estão de volta em S-Class. Se olharmos com atenção para a imagem do beco — onde Hyunjin canta enquanto tudo parece absurdamente desconexo — vemos ecos desses mesmos personagens: há alguém vestindo branco, segurando o que parece ser equipamento técnico; há uma figura que se assemelha a um trabalhador; e, ao fundo, um grupo que remete a banda marcial.
Não consegui pegar mais referências de outros clipes, infelizmente. Se souberem, coloquem nos comentários para que eu adicione ao post — eu adoraria expandir essa análise com outros olhares! Estou, inclusive, curiosa pra saber o que é aquele mergulhador voando no meio da cena.
Enfim, fiquei muito tempo apenas na cena do beco do Hyunjin. Vamos seguir em frente, mas antes, vamos analisar a letra:
"Cheia de coisas estranhas que não mudam
Ruas movimentadas"
Essa frase é simples, mas carrega uma sensação estranha de familiaridade com o caos. “Coisas estranhas que não mudam” pode soar contraditório à primeira vista, mas faz todo sentido se pensarmos no cotidiano moderno: o absurdo virou rotina. As ruas estão sempre cheias, sempre aceleradas, mas já nem reparamos mais. É como se o mundo tivesse se tornado um cenário bizarro que a gente já aceita como normal.
Hyunjin, no meio daquele beco, cercado por imagens surreais — o espelho quebrando, o chefe com bolo, os soldados em mini desfile — canta essas palavras como quem tá preso nesse looping de loucura. A cidade, representada por Seul, é viva, pulsante, mas também cansativa e repetitiva. A estranheza se torna parte da paisagem, algo com o qual você aprende a conviver. É essa a vibe que a letra transmite aqui.
Logo depois, temos Han aparecendo em um cenário onde várias latas voam ao redor dele, como se fossem confetes — só que ao invés de festa, a sensação é quase sufocante, caótica. Ele canta:
"Em cada rua, algo atrapalha"
Logo em seguida, o Bang Chan aparece com um caminhão de lixo. É nesse momento que Bang Chan canta:
"Limpe isso, limpe isso, volte."
Depois Han canta novamente:
"Uma lata que brilha apenas por fora, mas por dentro é vazio"
E então, Bangchan novamente:
"Chute, chute, chute"
Essa parte me pegou em cheio. O visual das latas pode parecer simples à primeira vista, mas junto com a letra, elas ganham peso simbólico. Han está cercado de "lixo bonito", coisas que parecem incríveis por fora, mas que por dentro não têm nada. Latas vazias, barulho oco. É como se ele estivesse dentro de uma crítica ao superficial, ao excesso de aparência sem conteúdo.
A metáfora da lata é cruel, porque ela pode se aplicar a muita coisa: pessoas que performam algo que não são, expectativas colocadas em cima de artistas, ou até mesmo o próprio mercado da música e sua cobrança por “embalagens perfeitas”. E aí vem a reação: “chute, chute, chute”. É um impulso de rejeição, de quebrar esse ciclo, limpar tudo o que atrapalha o caminho. Ele quer sair desse emaranhado de coisas sem sentido, dessa pressão disfarçada de brilho.
Os caminhões de lixo podem representar a necessidade de limpeza, descarte, renovação — tudo aquilo que está impedindo o avanço ou poluindo o espaço.
Essas frases se ligam diretamente à metáfora da limpeza — jogar fora o que é superficial, fingido, artificial. As latas brilhantes mas vazias que Han menciona são literalmente o "lixo" que Bang Chan está limpando. Há uma relação simbiótica entre os dois momentos: Han expõe a crítica, Bang Chan executa a ação. É quase como se Han denunciasse, e Chan resolvesse.
Após a cena caótica do caminhão de lixo e das latas voadoras, entramos em um momento visualmente mais "calmo", mas carregado de simbolismo: Seungmin aparece consertando carrinhos de brinquedo em uma bancada cheia de ferramentas como se fosse um mecânico meticuloso e concentrado. É nesse momento que ele canta:
"DesviandoEu estou acelerando na estrada serpentinosaLuxuoso como se eu estivesse na classe SA melhor das melhores na primeira classe"
Aqui temos uma referência direta e bem-humorada ao carro Classe S da Mercedes-Benz, conhecido por ser sinônimo de luxo, performance e status. A letra brinca com essa imagem de "primeira classe", não só no sentido literal de um carro ou avião de elite, mas também no que se refere ao próprio posicionamento dos Stray Kids: eles estão no topo, mas não por sorte ou aparência, e sim por esforço, identidade e talento.
A escolha de colocar Seungmin consertando carrinhos de brinquedo enquanto canta sobre luxo é brilhante. É quase irônico como ele está lidando com miniaturas, versões reduzidas e infantis daquilo que é desejado por muitos, como se estivesse dizendo: "a gente constrói o nosso próprio caminho para o topo, peça por peça, e ainda consertamos o que for preciso no caminho".
Logo após vermos Seungmin consertando os carrinhos de brinquedo, a narrativa visual avança para uma cena de perseguição que parece saída diretamente de um filme de ação futurista. Um caminhão de lixo avança pelas ruas, dirigido por Bang Chan e Lee Know, enquanto dois carros os perseguem — uma BMW M4 de 2015 e um carro esportivo amarelo.
O detalhe mais interessante? Esse carro esportivo é exatamente o mesmo modelo que Seungmin estava consertando na cena anterior — só que agora em tamanho real, inserido no contexto da perseguição. É como se aquilo que ele havia preparado silenciosamente nos bastidores agora estivesse ganhando vida no "palco" principal. Isso reforça a ideia de que o trabalho nos bastidores, a preparação silenciosa e detalhista, é justamente o que os impulsiona para a frente.
Após a perseguição intensa, a narrativa do clipe muda de tom. O cenário escurece levemente, enquanto o Stray Kids aparece dançando no centro, em formação poderosa, e figuras vestidas de preto correm ao redor deles — quase como sombras ou vultos de uma sociedade acelerada, caótica e indistinta.
É nesse momento que Felix canta:
“Estou acima do mundo, tão alto
Estarei brilhando lá dia e noite
Eles se perguntam como meu holofote é tão brilhante”
A imagem é simbólica. Mesmo cercados pelo caos — pelas “figuras pretas” que poderiam representar críticas, ruídos, ou simplesmente a massa indiferenciada que tenta acompanhar ou perseguir — os meninos mantêm a presença, dançam com precisão, como se afirmassem que, apesar de tudo, o centro é deles. A luz, o foco, a atenção… tudo converge para onde eles estão.
A letra reforça essa ideia de superioridade simbólica, não no sentido arrogante, mas como uma declaração de autovalor. Felix está no alto, iluminado, e o brilho não vem do acaso — é conquistado. E justamente por isso, os outros se perguntam “como o holofote é tão brilhante” — como eles conseguem, de forma tão consistente, se destacar. É uma crítica e uma resposta ao mesmo tempo: o brilho vem do talento, da dedicação, e da singularidade deles.
Essas figuras correndo ao redor, inclusive, parecem ser uma evolução da ideia mostrada nas cenas anteriores — algo sempre tentando acompanhar, julgar ou limitar, enquanto o Stray Kids continua a se movimentar, a criar, a brilhar. Eles não correm com o mundo — o mundo corre em torno deles.
Logo em seguida, o clima fica ainda mais intenso. As figuras pretas que antes apenas corriam ao redor do grupo agora se tornam mais agressivas. Descem escadas enquanto armadas, algumas até pulam os degraus com movimentos velozes, quase coreografados. A atmosfera é de tensão crescente, como se o Stray Kids estivesse cercado, prestes a ser atacado.
No refrão, a estética do videoclipe dá mais um salto surreal. Hyunjin olha para baixo e enxerga algo incomum: um buraco no chão, e dentro dele... outro Stray Kids, dançando. É como se houvesse camadas do grupo, uma versão “de fora” observando a versão “interior”, mais profunda, talvez mais verdadeira. Um reflexo? Uma essência? Um universo paralelo? A interpretação é aberta, mas o impacto visual é forte: o Stray Kids se contempla, se espelha, se duplica.
A música entra no refrão com uma batida envolvente e linhas que se repetem quase como um mantra.
“Contando estrelas
A estrela especial das estrelas, das estrelas, das estrelas...”
Essa repetição reforça a ideia de um brilho que se destaca entre muitos, uma luz única em meio a tantas. Eles não estão apenas dizendo que são especiais, estão se colocando como a estrela entre as estrelas. É ousado, mas também coerente com a narrativa do clipe: não somos apenas parte do sistema, somos a exceção que brilha além dele.
“O cara estranho, esse sou eu”
Essa frase é quase um grito de identidade. Não é apenas sobre ser diferente, é sobre abraçar essa diferença com orgulho. Se no começo do clipe falavam de “coisas estranhas que não mudam”, agora eles reivindicam esse lugar de “estranho” como seu, como algo valioso.
Logo depois, temos:
“Todos, todos, todos os tipos de trabalho são meus (brilhante, brilhante)”Aqui, parece haver um reconhecimento da versatilidade do grupo: eles fazem de tudo, cantam, dançam, compõem, produzem e brilham em tudo. Não são limitados por rótulos. “Brilhando, a classe é especial” reforça esse conceito de pertencimento a uma S-class, uma classe que não é sobre privilégio herdado, mas conquistado através de talento e esforço.
E com o verso final:
“A luz se espalha e a estrela brilha ainda mais”,
fica clara a ideia de que quanto mais eles se expõem, mais forte é o brilho. Não se trata de esconder ou se proteger, mas de aparecer, se expandir, resistir ao escuro, seja esse escuro a crítica, o sistema, a concorrência ou o próprio medo.
Depois do refrão, a cena se reconstrói quase como uma mudança de palco no meio de uma peça teatral. É Changbin quem toma o centro, entrando com força no rap — e como sempre, sua entrega é potente, marcada por ritmo e confiança. O cenário agora é um parque de skate, envolto numa atmosfera urbana, street, cheia de atitude. É o espaço perfeito para representar o hip-hop não só como estilo musical, mas como identidade.
Changbin manda:
"Passos de hip-hop, piso forte, minha especialidade é ser especial
Nos episódios especiais, eu entro e saio como se fossem minha casa
Eu não invejo outros estúdios, a minha sala é VIP
Eu estou cheio de características especiais inigualáveis"
Tudo aqui respira autoconfiança. Ele se coloca como alguém que não só participa do jogo, mas que domina o cenário. Ele entra e sai de situações difíceis, brilha em todos os contextos, e ainda por cima, não precisa invejar ninguém, porque o que ele tem é único. É uma reafirmação da individualidade — e de novo, a ideia de “especial” não como rótulo genérico, mas como algo conquistado, reafirmado a cada passo e verso.
Mas o interessante é o que vem logo em seguida. Han aparece completando esse rap, e aí a estética muda completamente: o parque de skate se transforma — os elementos ganham uma aparência de miniatura, quase como se estivéssemos dentro de uma casinha de boneca. Uma inversão visual poderosa.
Han canta:
"As pessoas que olham ao redor de tempos em tempos
Quando olham para apenas aquilo que brilha, correm atrás, mas esse costume não, não
Ao invés de perseguir o brilho, é melhor ser o brilho
Desse jeito é muito mais fácil se destacar, brilhar como um diamante, certo?"
Aqui, a crítica é direta. Ele fala das pessoas que vivem em busca do que já está brilhando — como se o valor estivesse no que parece ser importante, e não no que é. É uma crítica ao superficial, à tendência de correr atrás de status ou tendências só porque estão em alta. Han contrapõe isso com a ideia de se tornar o brilho por si mesmo — ser autêntico, ser o diferencial.
E o cenário pode representar exatamente isso: o mundo artificial que tentam empurrar para as pessoas como algo ideal, mas que, no fundo, é limitado, fechado, pré-fabricado. Ao mostrar esse cenário e colocar o Han ali, parece que a crítica é ainda mais visual: “você quer mesmo viver nesse mundo limitado ou criar o seu próprio espaço pra brilhar?”
Depois do momento introspectivo de Han, a adrenalina volta a subir. Os carros voltam a aparecer em perseguição ao caminhão de lixo, e agora um helicóptero entra em cena, sobrevoando tudo, como se o caos estivesse sendo observado de cima, como se houvesse um controle externo monitorando essa fuga. A estética aqui beira o cinematográfico, um tipo de ação coreografada que mistura velocidade, risco e espetáculo.
A música retoma o pré-refrão, e dessa vez, é como se cada linha fosse amplificada pelo contexto visual:
"Desviando
Eu estou acelerando na estrada serpentinosa
Luxuoso como se eu estivesse na classe S
A melhor das melhores na primeira classe"
A perseguição atinge o auge da tensão e, finalmente, vemos quem está no comando: Bang Chan está dirigindo o caminhão de lixo, com Lee Know como seu copiloto. É uma revelação significativa — os líderes do grupo estão literalmente conduzindo o veículo que limpa a bagunça, que remove o excesso, que carrega aquilo que o mundo não quer ver.
Isso reforça ainda mais o simbolismo que vinha sendo construído desde os versos iniciais: o lixo aqui não é apenas o descartável — é o que foi rejeitado, o que foi subestimado, mas que agora é reivindicado como parte da jornada.
Em seguida, a atenção se volta para Lee Know, que aparece cercado pelas figuras sombrias — os “ninjas” que antes corriam ao redor do Stray Kids.
Em seguida, temos uma cena intrigante: o caminhão de lixo é escaneado por uma espécie de filtro digital, revelando o que está em seu interior. Dentro, vemos caixas retangulares perfeitamente organizadas e, ao que tudo indica, as silhuetas de Bangchan e Lee Know — os responsáveis por dirigir o veículo.
As caixas, nesse contexto, não parecem estar ali por acaso. Elas podem representar aquilo que a sociedade costuma descartar: ideias, identidades, histórias ou sentimentos que foram considerados lixo, mas que o Stray Kids transforma em arte. O caminhão, então, deixa de ser apenas um veículo e passa a carregar simbolicamente o peso do “indesejado”, que eles conduzem pelas ruas, ressignificando e iluminando ao longo do caminho. O escaneamento também sugere vigilância, como se houvesse um esforço externo para desvendar, classificar ou controlar o que eles são — mas ainda assim, eles seguem firmes, avançando pela ponte iluminada, com seu conteúdo protegido.
Durante os versos "Estou acima do mundo, tão alto / Estarei brilhando lá dia e noite / Eles se perguntam como meu holofote é tão brilhante", Seungmin aparece dançando no centro de uma espécie de deck, completamente imerso em sua própria vibração — fones de ouvido nos ouvidos, desconectado do caos ao redor.
Enquanto isso, uma lula (ou polvo) gigante surge atrás dele, agarrando e jogando os "ninjas" — os mesmos que vimos correndo anteriormente — dentro de uma piscina que parece olímpica. A cena é absurda, quase surreal, mas ao mesmo tempo altamente simbólica. Seungmin não percebe o tumulto porque está concentrado em si mesmo, na música, no seu ritmo. Isso pode sugerir a ideia de isolamento criativo: mesmo quando o mundo tenta desestabilizar ou puxar para baixo, ele permanece firme, focado no brilho interno.
Logo após, Seungmin finalmente tira os fones e se vira para encarar a lula gigante, como se só então se desse conta da dimensão do que está acontecendo ao seu redor. O momento é breve, mas marca uma transição importante na narrativa visual: a desconexão dá lugar ao confronto com o caos e ele finalmente olha o "monstro nos olhos", por assim dizer.
Na sequência, a atmosfera muda drasticamente. O Stray Kids aparece dançando no centro de um cenário cercado por figuras encapuzadas. Diferente de antes, essas figuras não se movimentam, não correm. Elas apenas observam. Estáticas, misteriosas, como se julgassem ou venerassem. Ao redor, chamas criam um círculo de fogo, intensificando a dramaticidade da cena. É como se os garotos estivessem no centro de um ritual, mostrando sua força, sua performance, enquanto o mundo — simbolizado por esses vultos — apenas assiste. Uma possível metáfora para como, mesmo diante do julgamento, da pressão ou da expectativa, eles continuam a brilhar e a dançar no centro do palco.
A ponte entre o refrão e o dance break chega com uma mudança de tom: I.N canta com suavidade:
“Eu me sinto como a estrela mais brilhante
Em uma noite em que a luz transborda
Quando olho para o céu
Minha figura está bordada, sim, sim”
Ele está inserido no mesmo cenário onde Seungmin consertava carrinhos de brinquedo, mas agora o espaço carrega um ar mais onírico, quase suspenso no tempo.
Do lado de fora da janela, flutua um carro semelhante a um Fiat Alba — um detalhe que destoa da lógica realista, como se o mundo estivesse dobrando suas regras em favor de algo mais simbólico, mais lírico. O veículo pairando no ar funciona como uma metáfora visual para esse sentimento de leveza e brilho descrito na letra, e sugere que I.N está em um espaço onde o impossível se torna natural — onde ele, de fato, pode ser a estrela mais brilhante da noite.
Agora é Bangchan quem canta, com uma calma que contrasta com o caos anterior:
"Ela não cai
Fico tranquila em um só lugar, sim
‘Gwang’ de ‘brilhar’ e ‘in’ de ‘pessoa’”
A letra aqui é quase um jogo de palavras coreano. Gwangin (광인) pode ser interpretado como “pessoa brilhante” ou até como uma referência a alguém excêntrico, único. A ideia de permanecer tranquilo em um só lugar — apesar de toda correria e perseguição — reforça a confiança em sua própria singularidade. Ele não precisa correr atrás do brilho, ele é o brilho.
Logo em seguida, Seungmin aparece de volta naquela paisagem repleta de latas. Com um gesto, ele literalmente pausa o tempo. O mundo congela, as latas param de se mover, os detalhes ficam suspensos no ar. E então, com a mesma tranquilidade determinada, ele afirma:
"Essa é a nossa introdução, somos especiais, sim."
Essa pausa no tempo é simbólica — um respiro, um manifesto. Eles não precisam se explicar ou se encaixar: o Stray Kids é especial simplesmente por existir da forma que é. Uma pausa no fluxo caótico do mundo para declarar com firmeza: nós somos diferentes, e isso é a nossa força.
A atmosfera muda mais uma vez, agora ganhando tons épicos e cinematográficos. As figuras encapuzadas — antes observadoras, depois perseguidoras — passam por mais uma transformação: agora são lideradas pelos próprios membros do Stray Kids em uma marcha ousada contra a gigantesca lula que vimos anteriormente jogando os "ninjas" na piscina. A narrativa se vira de cabeça para baixo: o inimigo agora é claro, e as figuras antes misteriosas se tornam aliadas.
Enquanto isso, os integrantes cantam:
"Stray Kids, a equipe por trás de nós são nossas Forças Especiais
Estar em cima do palco, isso por si só é especial
Os espectadores não precisam de nada além de uma festa
Quando soltamos as rédeas, não precisamos de moderação"
O trecho é quase como um grito de guerra — uma declaração do que significa ser “S-class”. A letra se mistura com a imagem de união entre eles e aqueles que antes pareciam ameaçadores. É como se o Stray Kids, através da arte, da performance, tivesse transformado o caos em colaboração. Estar no palco, cantar, dançar, existir juntos: isso já é a força especial deles.
E como sempre, há festa, há energia, há liberdade. Nada de moderação.
E então, como se não bastasse toda a construção épica que vinha se acumulando, temos mais uma guinada absolutamente surreal e divertida. Felix, no centro da cena, tira os óculos escuros com um gesto lento, quase dramático... e de repente tudo muda.
A tensão desaparece. O cenário se transforma num instante: o que antes parecia uma batalha contra uma lula gigante, cheia de fogo, figuras encapuzadas e símbolos de força, vira… um clube de piscina familiar.
Sim, você leu certo. Um típico dia de verão: piscina azul, bóias, sorrisos. Aquela seriedade quase mitológica dá lugar a uma espécie de paródia suave. É o tipo de humor visual e quebra de expectativa que já virou marca registrada do Stray Kids. E funciona.
Do nada, o caos retorna.
A cor da cena escurece, a tensão volta a subir como fumaça. E é aí que vemos o carro esportivo — aquele mesmo que Seungmin estava consertando lá no começo, que perseguia o caminhão de lixo — agora explodindo atrás de Han, Felix e Hyunjin.
Mas, de repente — como se o tempo estivesse preso num loop ou a realidade fosse só mais uma das ilusões estilizadas do clipe — o carro des-explode. Isso mesmo. A explosão volta atrás, como se o caos tivesse dado um passo para trás só para dar espaço à próxima cena.
Hyunjin, sem perder tempo, puxa a câmera com a mão num gesto que lembra diretamente o Homem-Aranha lançando sua teia. É como se dissesse: “vem comigo, agora é minha vez de guiar”. E, com isso, somos arremessados direto para o dance break.
A música se intensifica. Os movimentos ganham peso. A câmera gira, se aproxima, recua, como se estivesse dançando junto com eles. O cenário está em constante transformação, mas os Stray Kids estão ali, no centro, dominando o caos com precisão.
No meio do dance break, o clima se mistura entre o frenético e o absurdo: os Stray Kids jogam a lula gigante na piscina olímpica, como se estivessem finalizando uma missão secreta num filme de ação com toques de surrealismo.
E então, como um eco do começo, o remix da frase “Contando estrelas–” irrompe entre os cortes rápidos e closes dramáticos.
Depois do dance break insano, o clipe nos leva de volta ao heliponto do começo. A cidade ao redor continua agitada, mas o que acontece ali no topo do prédio é pura poesia visual.
Para os cinéfilos de plantão, essa cena é ouro. Ela parece beber diretamente da fonte de Truque de Mestre: O Segundo Ato (Now You See Me 2). Se você lembra bem do final do filme, Daniel Atlas (interpretado por Jesse Eisenberg) realiza um truque com luzes que dá a ilusão de que as gotas de chuva estão suspensas no ar, criando um momento de hipnose coletiva. Aqui, o Stray Kids faz algo muito semelhante: usam jogos de luz e coreografia para simular o tempo parado, como se estivessem no controle da própria realidade. Um toque de mágica moderna, com um quê de deboche estiloso.
O heliponto em si também traz outra referência clara: a cena do Ano Novo, no mesmo filme, onde os Quatro Cavaleiros (J. Daniel Atlas, Merritt McKinney, Jack Wilder e Lula May) fingem uma viagem luxuosa de jatinho particular para atrair os vilões. A ideia era simples: parecer que estavam em um lugar, quando na verdade estavam em outro — ilusão, espetáculo, controle da narrativa. E o Stray Kids faz o mesmo.
Curiosamente, assim como no final de Truque de Mestre: O Segundo Ato, o clipe de “S-Class” também termina em um local próximo a uma ponte. No filme, é o famoso Rio Tâmisa, palco da última grande ilusão dos Cavaleiros. No MV, temos um cenário urbano, elevado, com o céu amplo e a cidade iluminada ao fundo — algo que evoca essa sensação de que estamos no fim de um espetáculo grandioso. Não digo que seja uma referência direta, mas a semelhança é impossível de ignorar. E como Truque de Mestre 2 é um dos meus filmes favoritos, achei essa conexão simplesmente encantadora.
E então, tudo termina como começou — mas diferente.
Aquela chuva que antes estava suspensa no ar, como se o tempo estivesse em pausa, volta a cair lentamente, gota por gota. E o Stray Kids encerra com a frase:
"A luz se espalha e a estrela brilha ainda mais."
Em suma, S-Class não é apenas um videoclipe caótico e divertido — ele é um grande quebra-cabeça visual e simbólico que costura o passado, o presente e a essência do Stray Kids. Desde o espelho que quebra no início, como um portal para outra realidade ou um colapso daquilo que é “normal”, o clipe já avisa: nada aqui será convencional. A quebra do espelho pode ser lida como a ruptura da imagem padronizada que a indústria espera, e o começo da exibição do que é “especial” — no caso, eles mesmos.
E isso se comprova nas múltiplas referências a eras passadas: os cientistas de jaleco, os trabalhadores e músicos de God’s Menu, os guardas cerimoniais de Thunderous, e até o dragão lá no fundo. Tudo isso retorna, mas reconfigurado, como se fosse um multiverso do Stray Kids, onde o passado é homenageado e, ao mesmo tempo, distorcido para criar algo novo.
No fim das contas, a música e o clipe falam sobre ser diferente em um mundo que busca uniformidade, sobre brilhar do próprio jeito, sobre transformar o ordinário (um caminhão de lixo, por exemplo) em palco de espetáculo. "S-Class" é, antes de tudo, uma celebração de identidade — caótica, engraçada, explosiva e absurda —, mas também profundamente simbólica e conectada com tudo que eles vêm construindo desde o começo da carreira.
É como eles dizem:
"Ao invés de perseguir o brilho, é melhor ser o brilho."
📝 Obs.: Nenhuma das interpretações citadas aqui são oficiais ou confirmadas. Tudo o que escrevi é baseado na minha própria leitura, percepção e amor por analisar videoclipes, principalmente os do Stray Kids. Se você viu outras referências, me conta nos comentários!
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